Monsanto
tentou comprar Syngenta por US$ 45 bilhões. Investida ocorre no momento em que parlamentares
financiados pelo agronegócio tentam alterar rotulagem de transgênicos no Brasil:
aprovado na Câmara, projeto está no Senado
A imprensa noticiou recentemente (Valor
Econômico, 11/05/2015) a tentativa da Monsanto, fabricante estadunidense de
agrotóxicos, em adquirir sua concorrente suíça Syngenta, por US$ 45 bilhões. A
oferta, que foi por enquanto recusada pelo conselho de administração da
Syngenta, resultaria na maior fornecedora mundial de sementes transgênicas e agrotóxicos,
com um valor de mercado combinado de US$ 96,6 bilhões. Juntas, as corporações
deteriam 30% do mercado mundial de venenos – que em 2014 gerou receitas de US$ 57
bilhões – e perto de 45% do setor de sementes transgênicas.
A Syngenta é a maior vendedora de venenos do
mundo. Cerca de 60% de sua receita vêm dos negócios na América Latina e Europa.
75% de sua receita em 2014, de US$ 15 bilhões, decorreu das vendas de fungicidas,
herbicidas e outros venenos.
Já a Monsanto, que em 2014 faturou US$ 16
bilhões, gerou 65% deste resultado com vendas de sementes e do licenciamento da
genética de plantas para concorrentes.
Para a Monsanto, adquirir a Syngenta
significaria retornar ao negócio de agroquímicos após 20 anos de foco na
modificação genética de sementes. Além disso, analistas especulam que esta
operação permitiria à Monsanto tentar mudar sua sede fiscal para Basiléia, na
Suíça, onde a Syngenta é sediada – uma operação chamada de inversão fiscal. A
alíquota de imposto da Monsanto nos EUA é de 29%, enquanto a Syngenta paga 15%
na Suíça.
O setor de sementes geneticamente modificadas
tem crescido a ritmo mais lento. As vendas subiram 4,7% em 2014, comparado a
8,7% em 2013 e a uma média de 21,3% nos cinco anos anteriores. Muitos países
impõem restrições ao seu uso, por conta dos danos ao meio ambiente e à saúde
que causam. As vendas de produtos não transgênicos no varejo dos EUA saltaram
15% em 2014, para US$ 9,6 bilhões. Os EUA são o maior produtor de transgênicos
do mundo, com 73,1 milhões de hectares, seguido do Brasil, com 42,2 milhões.
O plantio generalizado de sementes modificadas
através da biotecnologia para produzir toxinas letais a pragas e suportar
herbicidas como o Roundup, da Monsanto, contribuiu para a evolução de insetos e
plantas que podem sobreviver a esses produtos. Isso ajudou a aumentar as vendas
de inseticidas e herbicidas para combater o problema – e deu força à acusação
de que o uso de sementes transgênicas está ampliando o emprego de pesticidas sintéticos
que podem ameaçar a saúde humana e o meio ambiente.
Para os analistas de bancos, com muitos dos maiores
mercados agrícolas do mundo já saturados de transgênicos e outros, como a China
e a Europa, resistindo à aprovação desses produtos, os venenos podem ser um
modo de a Monsanto se expandir.
No Brasil, a fabricação de venenos gerou
faturamento líquido de R$ 25 bilhões em 2014, expansão de 13% em relação ao
resultado de 2013. Foram comercializadas 936 mil toneladas de agrotóxicos em
2014, 4% a mais que o volume vendido em 2013. O setor das fabricantes de
agrotóxicos importou 422 mil toneladas de venenos em 2014, a um custo de US$
7,1 bilhões, e exportou 38 mil toneladas, faturando US$ 400 milhões. O déficit
comercial resultante foi de US$ 6,7 bilhões, 5% maior do que o verificado em
2013.
Segundo a Relação Anual de Informações Sociais
(RAIS) do Ministério do Trabalho em Emprego, em dezembro de 2013 eram 6.661
trabalhadores empregados nas fabricantes de agrotóxicos no Brasil. Deste total,
57,7% (3.848 trabalhadores) estavam em fábricas localizadas no Estado de São
Paulo; 12,7% no Paraná; 10,3% em Minas Gerais; 5,9% no Estado do Rio de
Janeiro; 5,3% no Ceará; 2,4% na Bahia; e 2,2% no Rio Grande do Sul. Os demais
3,1% de trabalhadores estavam empregados em fábricas de menor porte em Alagoas,
Goiás e Mato Grosso.
A Monsanto possui fábricas em São José dos
Campos, SP, e Camaçari, Bahia. A Syngenta mantém fábricas em Paulínia, SP,
Itápolis, SP, Matão, SP, Formosa, GO e Ituiutaba, MG.
Neste contexto, a Câmara dos Deputados aprovou
projeto que acaba com a exigência de rotular alimentos que utilizam produtos
geneticamente modificados destinados a consumo humano. Isso ocorreu 28 de abril
deste ano, Dia Mundial em Memória das Vítimas de Acidentes e Doenças no
Trabalho. Triste coincidência.
Foram 320 votos a favor e 120 contra em relação
ao PL 4148/2008, do deputado ruralista Luiz Carlos Heinze (PP/RS). O aviso aos
consumidores, antes presente na forma de um símbolo com um “T” amarelo e bem
visível nas embalagens, será obrigatório apenas nos alimentos que apresentarem
presença de organismos transgênicos “superior a 1% de sua composição final,
detectada em análise especifica”. De acordo com a proposta, deverão constar no
rótulo as seguintes expressões: “(nome do produto) transgênico” ou “contém
(nome do ingrediente) transgênico.”
No mundo, 28 países adotam a rotulação de
transgênicos, como Japão, Austrália, Rússia, China e países da União Europeia.
Além disso, o projeto do ruralista viola o artigo 6º do Código de Defesa do
Consumidor, que aponta que são direitos básicos do consumidor saber “a informação
adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação
correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos
incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem”.
A liberação de variedades transgênicas no Brasil
é definida pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). A agência,
no entanto, nunca recusou a aprovação de nenhuma variedade geneticamente
modificada, muitas das quais não foram aprovadas em outros países, como o recém
aprovado eucalipto transgênico.
O projeto está agora no Senado, aguardando
parecer e votação. Essa discussão ocorre num momento em que 42,2 milhões de
hectares são cultivados com transgênicos no Brasil, o que representa mais de
90% da área plantada com soja, algodão e milho, que são as principais variedades
transgênicas cultivadas comercialmente no país.
Fonte:
Thomaz Ferreira Jensen,
economista do DIEESE na subseção do Sindicato dos Químicos do ABC.